As vezes seguro minha onda para não comentar assuntos polêmicos aqui no blog. Mas deste não tenho como escapar. Não vi muitos cartunistas emitirem opiniões sobre. Talvez porque suas mãos direitas estejam correndo risco... e o risco a que me refiro não é de nanquim. Mas tenho pica grossa... Quero dizer, tenho peito! Vamos com ética o suficiente para não ofender nem gregos nem troianos nas linhas a seguir.
Bem, concordo e discordo de toda esta confusão que está acontecendo acerca das charges que retrataram o Profeta Muhammad. O jornal dinamarquês Jyllands-Posten publicou em 30 de setembro de 2005 a primeira charge certamente tendo em vista a polêmica lucrativa de alguma maneira. Mas acredito que não foi por falta de pesquisa ou por inocência que cometeram a suposta "gafe". A OCI (Organização da Conferência Islâmica), pediu na época da primeira publicação que os muçulmanos protestassem pacificamente contra o governo dinamarquês por não ter "condenado categoricamente" a publicação dos desenhos.
Discordo das republicações de cunho sensacionalista (e sabe-se lá mais o quê) em nome de uma falsa liberdade de imprensa por parte de outros jornais europeus. Aliás, como cartunista que sou, concordo com a liberdade de imprensa, desde que haja responsabilidade e respeito. Portanto, não concordo em pisar nos valores éticos e morais de qualquer grupo religioso ou étnico. Logo, concordo com o mau estar que as charges causaram no Islã, que não permite representações (sequer respeitosas) de Muhammad.Concordo com o pedido de retratação destes jornais europeus para com o Islã... mas não em elevar este pedido de retratação ao país que publicou a charge. Não concordo que o pensamento de uma pessoa possa representar a opinião de um país que se diz democrático e que defende a liberdade de pensamento. Acredito que os muçulmanos têm um uníssono de opinião e, uma charge, talvez represente realmente o pensamento de uma nação. Já entre europeus, o raciocínio talvez não seja o mesmo. Então, não concordo em pregar o ódio por uma nação inteira por conta da idéia infeliz de uma pessoa. "Olho por olhos, dente por dentadura" não é exatamente o lema da justiça árabe. O próprio xeique Ahmad Abdul Aziz al Haddad disse: "Estas charges são provocativas e saíram de mentes doentes de algumas pessoas irresponsáveis". Doentes e irresponsáveis?! Aparentemente o xeique conhece profundamente a alma "cartunística" e tem consciência de que o estrago foi causado por apenas doze homens que supostamente não conheciam profundamente os segredos do Islã.Não sei se concordo com certas reações por conta dos desenhos, mas de qualquer maneira é um movimento interessante. Por exemplo, o boicote aos produtos dinamarqueses e noruegueses. Em Bahrein queimaram produtos lácteos destes países em praça pública. Tudo bem, eles têm uma das maiores rendas per capita do planeta. Enfim, quem pode, phode!!!
Mas não concordo com nenhuma reação violenta seja qual for o motivo. Alguns jornais publicaram que a recompensa pela cabeça de um desses cartunistas servida na bandeja e regada ao molho vinagrete seria de sete mil euros. Isto sim é uma violência! Poxa, será que um cartunista vale sete mil euros?! Vale lembrar que Salman Rushdie tem a cabeça na bandeja avaliada em milhões de dólares por conta dos Versos Satânicos. Bem, uma imagem vale por mil palavras. Fazendo as contas, numa tétrica matemática, um cartunista teria que fazer centenas de desenhos para se equiparar no mercado de ações em que Salman é avaliado.
Brincadeiras à parte, sempre imaginei que o cartum seria uma linguagem universal e atemporal. Mas parece-me que nossas próprias cabeças tornaram-se o alvo desta arma de comunicação. Agora temos trincheiras e principalmente fronteiras, antes inexistentes. Lamento.Texto: Pryscila Vieira
# introduzido por Pryscila @ 5:14 PM